A D. Olga, da Associação dos Antigos BNUs, teve a atenção, sempre oportuna e bem-vinda, de nos enviar emails a lembrar que foi finalmente aberto o MUDE, na nossa antiga sede da Rua Augusta.
Então lá fomos, eu e o Fernando Miguel, em romagem de saudade, fazer uma inspeção.
Demos a volta aos pisos todos. Olha, aqui, uma vez, eu fiz isto e aquilo. Aqui havia uma casa de banho, mantiveram o balcão completo no rés-do-chão. Repartição de Câmbios, onde os dois começámos quando entrámos no Banco.
Penso que não é estranho à manutenção dessa memória o facto de nós, antigos funcionários do BNU, nos termos interessados pela história do edifício, visitando o local, falando com a Drª Bárbara, diretora do Museu, predispondo-nos a colaborar para manter essa memória.
Não sei se estas recordações do BNU serão mantidas quando o Museu estiver completamente preenchido de design e de moda . É que, por enquanto, não há qualquer sinal de moda e/ou design.
Todo o trabalho de recuperação feito nestes anos, no edifício está profusamente descrito e documentado com fotos no livro de 448 páginas que é vendido no rés-do-chão. O saco custa 3 euros, o livro 26.
As informações - completas - e toda a recuperação - excelente - levada a cabo no edifício, nada nos diz sobre as pessoas que ali trabalhámos, os problemas, as desilusões, as tragédias, as alegrias, as conquistas, as amizades que naquelas paredes, naqueles balcões, naquelas escadarias se desenvolveram, oculta ou descaradamente.
Nada consta no livro sobre a história do saudoso e meu grande amigo Augusto, porteiro do banco, que tinha nos cofres da cave dólares americanos, francos franceses ou suíços e os vendia, inclusivamente aos elementos da administração do Banco, para as viagens ao estrangeiro.
Nada consta dos romances que ali desenvolvemos, mas também nada de abusos, de assédios de toda a maneira e feitio que muit@s colegas sofreram.
O livro tem uma ótima referência sobre "a grande pintura sobre tábuas de Jaime Martins Barata, O Desenvolvimento Ultramarino e a Metrópole (1964)" mas não sabe da circunstância em que aquele painel foi ali colocado e que o Fernando Miguel sabia desde os anos em que trabalhou no serviço de câmbios, naquelas secretárias em frente do quadro e esteve a contar: os construtores da remodelação do edifício para as comemorações do centenário (1964) verificaram que, no rés-do-chão, não havia casas de banho para funcionários. Então foi construída uma casa de banho, precisamente no local que teve de ser tapado pelo quadro e com entrada junto aos elevadores da escada central.
O 6º andar é apresentado como o local onde a administração do Banco tomava as suas refeições. Mas o livro não sabe que no final dos anos 1970, o Departamento de Normas e Instruções, tivemos obras no 4º andar e fomos, comandados pelo saudoso Sr. Olímpio Mòsca Òvelha (OMO), POR 15 DIAS, para o 6º andar e ali estivemos durante dois anos. Era um sítio agradável. Estávamos todos juntos, ao lado uns dos outros e todos ao lado do chefe OMO. De vez em quando, o genial escritor e saudoso amigo Nuno Bermudes lançava para o ambiente uma das suas e toda a gente se ria a bom rir, menos, às vezes, o visado. E ali veio um dia o saudoso, delicado (às senhoras não se bate nem com uma flor) , casanovelesco Oliveira Martins com uma saliente dentadura nova que lhe foi desenrascada pelo irmão dentista, depois de um violento murro de um marido, tropa dos comandos da Amadora, que inesperadamente veio a casa e rompeu pelo quarto onde ele estava no bem bom e, pelos visto, até em posição de ombro-arma! Afinal ele só tinha querido poupar 200$00 que tinha de pagar na pensão da baixa. Mas a senhora que arriscou levá-lo para sua casa para poupar dinheiro, telefonou passados dois dias a pedir desculpa, que já tinha posto o marido de castigo a dormir no sofá.
Seja como for é bom lembrar e reviver a nossa juventude a que as paredes, as escadas, o balcão completo, o chão, os tetos, os quadros nos conduzem, como uma espécie de POMPEIA desenterrada das cinzas que a taparam durante anos.